Moderna tecnologia, motores dois-tempos de alta potência específica e o temperamento quente habitual dos veículos italianos: com esses predicados a Agrale conquistou uma fatia (ainda que pequena) do mercado nacional para suas motos de uso misto das linhas SXT/Elefant e Elefantré.
A história da marca começou em 14 de outubro de 1965, quando o grupo Francisco Stedile adquiria a Indústria Gaúcha de Implementos e Máquinas Agrícolas S.A., AGRISA, e a transferia para Caxias do Sul, RS. Ao lado da produção de microtratores Agrisa-Bungartz e motores diesel estacionários, sob licença de empresas alemãs, desenvolveu por seus próprios meios um pequeno trator de quatro rodas e motor de um cilindro, seguido por modelos com motores diesel e de dois cilindros. Em 1975 inaugurava fábrica própria, em 1982 lançava o caminhão TX 1100, e no ano seguinte, iniciava a produção de ciclomotores. Mas foi o acordo de cooperação técnica e comercial com a empresa italiana Cagiva, firmado também em 1983, que representou o passo mais decisivo para a empresa, de capital totalmente nacional.
No final do ano seguinte chegavam ao mercado as motocicletas Agrale SXT 16.5 e Elefant 16.5, de uso misto, com a mesma mecânica e diferenças apenas em detalhes - a principal era o tanque de combustível, com capacidade de 11 litros na primeira e 16,1 na segunda. Muito semelhantes aos modelos Aletta Rossa e Elefant da Cagiva, representavam importantes avanços para o segmento, até então restrito à Honda XLX 250 R e a Yamaha DT 180. O pequeno motor de 125 cm3 e dois tempos tinha arrefecimento a água, pela primeira vez em uma moto brasileira, e desenvolvia potência de 16,5 cv (daí a denominação 16.5, que não indicava 165 cm3 de cilindrada, como muitos imaginavam) e torque de 1,72 m.kgf. O freio dianteiro a disco era inédito em uma uso-misto nacional e as suspensões eram modernas. Se o desenho não surpreendia, estava em paridade com a DT 180 N, lançada quase ao mesmo tempo, e à frente da XLX.
Embora modernas e com desempenho razoável, as Agrales não decolaram logo de início. Havia problemas de qualidade e muitos se decepcionavam com o baixo torque do motor de 125 cm3. Assim, apenas um ano depois a linha já crescia com as versões de 190 cm3: SXT 27.5, Elefant 27.5 e Dakar 30.0, esta com aparência e nome inspirados no maior rali do mundo, o Dakar. Como nas 16.5, os números indicavam a potência, de 27,5 ou 30 cv, e não a cilindrada. Eram as uso-misto nacionais mais potentes. O torque máximo de 2,52 m.kgf nas duas primeiras e 2,6 m.kgf na Dakar (que tinha novas palhetas de admissão e outro escapamento) tornava-as bem mais ágeis. Outras novidades eram as suspensões de maior curso, apoios de pés denteados, pedais retráteis e o requinte de um indicador digital de marcha no painel. Mas o bom desempenho ainda não garantia o sucesso das motos gaúchas, que em 1987 ganhavam um reforço na concorrência com a XLX 350 R. Era preciso resolver os problemas de confiabilidade e encontrar um nicho de mercado a ser explorado. E então chegava a linha 1988 da Agrale, denominada Série 2.
Para melhorar a robustez e a qualidade, muitos componentes e sistemas foram revistos, entre eles pistão, biela, radiador, vedação da bomba dágua, válvula termostática e filtro de ar. E surgia a Explorer, versão da SXT 27.5 preparada de fábrica para o fora-de-estrada e as competições de enduro, que se tornaria grande sucesso.
Logo renomeada 27.5 E, pois o nome Explorer era de propriedade da Yamaha, a versão vinha despojada de tudo o que habitualmente é removido para competição: luzes de direção, bateria, retrovisores, miolo de ignição (não havia chave), conta-giros, marcador de temperatura, bagageiro saia do pára-lama traseiro, apoios de pés do garupa, as coberturas da corrente e do pinhão e a bomba de óleo dois-tempos, que fazia a mistura no próprio tanque. Para se adequar aos novos terrenos, tinha pneus de cravos (Pirelli Garacross), proteções para o motor, o radiador e o escapamento, relação final de transmissão mais curta e itens de alumínio, aros de roda da Two Hard, ponteira de escapamento da Three Heads, um tanto barulhenta e guidão. Pesava 9 kg menos que a SXT.
A 27.5 E foi bem recebida, vendendo cerca de 7.000 unidades no primeiro ano - mesma média da Elefant 27.5 e da Dakar, sendo a SXT 27.5 a mais vendida da linha de 190 cm3 - e tornando-se personagem freqüente nas trilhas, onde até então a DT 180 liderava de modo quase absoluto. Mas as outras Agrales começavam a perder atrativos, indicando a necessidade de uma renovação da linha, conforme os passos da Cagiva com sua Elefantre - fusão das palavras elefant e tre, ou três em italiano. Lançada em março de 1989, a Elefantre marcava um segundo tempo para a Agrale, até mesmo pela origem: era fabricada em Manaus, AM, em uma nova fábrica de 6.000 m² construída para usufruir de benefícios fiscais do governo, que compunham o PPB ou Processo Produtivo Básico. Suas linhas eram modernas e atraentes, com predomínio de retas e ângulos, um tanque amplo - mas menos incômodo às pernas do piloto que o da Elefant - e um banco que o envolvia. Detalhes interessantes eram a barra de alumínio que enrijecia o pára-lama dianteiro e o painel, um bonito e bem iluminado CEV italiano. A conveniência da partida elétrica, opcional, era a única novidade no motor de 190 cm3 e 30 cv, o mesmo da Dakar, que também recebia o recurso. A Elefantre utilizava também um freio dianteiro mais eficiente, sem a tendência a ficar "elástico" como o da linha anterior, e nova suspensão frontal, com o eixo à frente do garfo (nas 27.5 e 30.0 ficava atrás deste, e nas 16.5, na mesma linha). Em 1990 essas melhorias chegariam a 27.5 E.
A Agrale não descartou a base da SXT. Além da 27.5 E, uma versão simplificada e menos potente foi desenvolvida, para tornar a marca mais acessível. Denominada SST 13.5, utilizava um motor de 125 cm3 arrefecido a ar da Cagiva, com 13,5 cv de potência e 1,32 m.kgf de torque. Como era voltada ao uso urbano e não às trilhas, a relação de transmissão foi alongada, mas em excesso: a sexta marcha não conseguia manter a velocidade constante, na estrada, a menos que o piloto se abaixasse. Para reduzir os custos, vários itens eram suprimidos: conta-giros (e termômetro do motor, é claro) no painel, o retrovisor direito, saia do pára-lama traseiro, bagageiro. Mais importantes, o freio dianteiro passava a tambor e a suspensão traseira era de duas molas - isso mesmo, uma Agrale sem os recursos técnicos que sempre caracterizaram a marca. Embora a SST tenha surgido para competir com a CG Today e a Yamaha RD 135, é inegável que seu lançamento incomodou a Honda, fazendo-a trazer de volta em 1992 a XL 125 S, descontinuada em 1988. A tendência do mercado brasileiro nos anos 80, em que cada marca buscava ocupar nichos não-explorados e não concorrer com as demais, finalmente mudaria na nova década.
Expandida a oferta com SST e Elefantre, a Agrale tinha outro problema: o governo federal controlava, à época do Plano Verão de preços congelados, o preço das motos até 150 cm3 por meio do CIP, Conselho Interministerial de Preços. Para a marca ex-gaúcha, isso criou uma situação difícil, em que a linha 16.5 foi pega pelo CIP com valores defasados, inferiores até ao da simplificada SST 13.5. Qual a solução? Naturalmente, descartar a SXT e a Elefant de 125 cm3 em favor de uma nova moto, a Elefantre 16.5, lançada em outubro de 1989.
Visualmente era idêntica a 30.0, exceto pela decoração, mas não oferecia partida elétrica. O motor de 125 cm3 só proporcionava bom desempenho acima de 7.000 rpm, mas o preço convidativo em relação à versão maior lhe garantiu a liderança de vendas na marca. Suas concorrentes eram a conhecida DT 180 Z, a recém-chegada Honda NX 150 e, de certo modo, a Yamaha TDR, apesar de seu conceito mais voltado ao uso urbano. Uma nova safra de novidades para a Agrale vinha nos modelos 1992. Começava pela partida elétrica na Elefantré 16.5 - o nome recebia um acento inexistente na Itália, para facilitar a pronúncia pelos brasileiros -, passava por mudanças técnicas em ambas as versões, por um banco bem mais baixo na SST (a 835 mm do solo, contra 890 mm da anterior, esta a mesma medida de uma Yamaha XT 600 Ténéré!) e chegava a uma nova fora-de-estrada, a 27.5 EX.
A Elefantré 30.0 (agora com apenas 26,5 cv em função de nova metodologia de medição) ganhava trava de direção integrada ao miolo do ignição, roda traseira de 17 polegadas com pneu 4,60, em vez do antigo 4,10-18, e amortecedor posterior pressurizado com reservatório de gás separado, recurso que mantém o bom funcionamento por mais tempo em uso intensivo. Em toda a linha Agrale a ousadia tomava conta do visual, com cores contrastantes e grafismos originais, que pareciam não caber nas partes em que eram aplicados.
Amarela com o quadro e vários detalhes em magenta (rosa-choque, diziam as más línguas) era a combinação escolhida para a EX, que não substituía a 27.5 E, mas se somava a ela para vencer mais e mais enduros. Além do amortecedor pressurizado e da roda de 17 polegadas na traseira, como na Elefantré, trazia reservatório de expansão para o líquido de arrefecimento, para menor risco de fervura nos trechos "travados", sistema de lubrificação das articulações da suspensão traseira e um potente freio a disco nessa roda. Em 1993 o mercado de motos era agitado por uma nova fase do PPB, permitindo às fábricas montar em Manaus motos com componentes importados, sem o imposto correspondente, por um período limitado. Para a Agrale isso representou grandes mudanças, começando pela Husqvarna WR 250 e a Cagiva Super City 125, passando por modelos maiores do grupo (incluindo MV Agusta) e chegando à pequena Legion 125, com motor de quatro tempos, última moto vendida com o nome Agrale.
Elefantré 30.0, SST 13.5 e as enduristas 27.5 E e EX foram produzidas até 1997; a Dakar havia desaparecido já em 1993. Isentas de muitos dos problemas que afetaram a marca em seus primeiros anos, fizeram fãs e vez ou outra ainda são vistas pelas ruas, estradas ou explorando trilhas por esse imenso Brasil.